Quarta-feira, 31 de Janeiro de 2007

Sobre o Pico

Feita a narrativa da subida ao Pico, permitam-me as as seguintes reflexões:

Quase todas as povoações estava situadas à beira mar e a população em grande parte dedicav-se  à vida marítima, essencialmenteà caça das baleia e comércio de óleos.
As povoações mais desenvolvidas seriam o Cais( leia-se S. Roque ), a Lages, a Calheta e a Madalena.
Embora já frequente a subida à montanha do Pico em 1939, nos princípios do século era de difícil ascensão e contavam-se as pessoas que a tinham realizado.
Tal como agora, já havia guias.Mas portadores de víveres agora são um luxo!
As dificuldades do terreno seriam enormes.Até os cavalos não passavam das chamadas Criações ( onde ficam?).
No fim do primeiro dia de viagem, só conseguiram atingir uma furna, onde por um buraco se podia lançar uma pedra sem se ouvir o eco da sua queda no fundo.Que furna? A de S. Matias?
Seria costume lançar fogo às urzes secas para iluminar a encosta.As dificuldades da subida não se alteraram, mas estranho que no mês de Julho, de manhã, no alto do Pico a temperatura estivesse abaixo de zero.Mas a aguardente do Pico já fazia milagres na altura...
Também não se alterou a beleza do nascer do dia, as deslumbrantes vistas para o Faial, S. Jorge, Graciosa e Terceira.E para o próprio Pico!E para o mar imenso,a perder de vista!

A não perder uma subida ao Pico! Se até uma velhinha de 80 anos o fez!

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publicado por viajantenocanal às 21:09
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Sábado, 13 de Janeiro de 2007

Sobre o Pico

Termino hoje a narrativa da subida ao Pico, descrita por AGNELO CASIMIRO na

revista GIL VICENTE, no ano de 1939.
 
" É que elevando-se lateralmente num extremo dessa grande cratera, uma

erupção mais recente provocara uma nova elevação dumas dezenas de metros de

altura. É o chamado « Pico Pequeno ». A encosta íngreme do « Pico Pequeno »

era de lava solta, movediça, e por isso dificil e arriscada de subir. Um

dos guias trepou a pés e mãos como um gato solerte. Chegando ao cume,

lançou-nos uma corda com um laço. Passamos o laço pela cintura e, cad um de

nós, por sua vez, foi trepando a pés e mãos, confiados na corda que nos

aguentava. Eu sentia o calor da lava e dos fumos que pelos interstícios das

pedras soltas  se evolavam no espaço. Sentia o rumor da ebulição, o ronco

dos gazes em luta, o crepitar do fogo. Tinha a impressão de que tôda aquela

pedra amontoada, caprichosamente em pirâmide, ia ruir, abater, e que eu ia

cair, sem remédio numa fogueira colossal.
A um e um fomos chegando ao cume do « Pico Pequeno », cujo planalto tinha

uma reduzida extensão. Uma fumarola ténue aquecia-nos. Ali nos conservamos

algumas horas. Uma neblina muito abaixo de nós cobria-nos a terra. Viamos

apenas acima de nós o céu puríssimo. Os guias garantiam-nos que depois da «

nascença do sol » tudo ficaria descoberto. E assim foi.
Foi do cume do « Pico Pequeno » que eu vi nascer o sol daquele dia. Nunca

poderei esquecer esse espectáculo maravilhoso. Como fogueira rubra o sol

surgiu no horizonte. Eleva-se um pouco, e as nossas sombras projectam-se

alongadas, sem fim, sobre as nuvens brancas que cobriam o poente. Disse-nos

o excursionista que este era o chamado « espectro de Brocken ».
Ao passo que o sol ia subindo iam-se esfarrapando as nuvens que tomavam

agora côres brancas, muito brancas, como pastas colossais de algodão em

rama. Umas estendiam-se pela encosta, dando-nos a impressão de lagos

cobertos de gêlos; outras pairavam sobreo mar, dando-nos a impressão de «

ice-bergs »; outras, mais esfarrapadas ainda, impelidas por uma brisa

suave, davam-nos a impressão de rebanhos de cordeirinhos brancos pastando,

incoerentemente pela serra.
Finalmente as nuvens desapareceram totalmente. Viamos agora todo o

vasto-vastíssimo-panorama. Ali perto o Faial, mais pequenino ainda, isolado

no meio das águas envolventes; para o outro lado S. Jorge alongando-se como

uma courela, pelo mar; mais ao longe a Graciosa, depois a Terceira, mais

esbatidas pela distância. O mar imenso, manso como um lago, parecia

acalentar estes pedaços de terra de formas irregulares como berços floridos

e tranquilos na imensidade das águas.
A ilha do Pico, em redor de nós, aquecia-nos na sua configuração montanhosa

e era interessante ver como cada um dos muitos montes daquela ilha

terminava invariavelmente por uma cratera aberta no cume, donde áquela hora

matutina se exalavam fumos brancos em que se desfazia a neblina que o sol

ia aquecendo.
Avultava ainda a nossos olhos uma quebrada na rocha viva, talhada quase a

pique numa altura que nos disseram ser de 400 metros e que ao fundo se

alongava num extenso areal.
Por toda a parte a natureza tomava aspectos bárbaros, acusando convulsões

tremendas, rasgões enormes, uma faina titânica, ciclópica , de grandes

cataclismos. Era com efeito um panorama formoso, mas, como costuma

dizer-se, em certos aspectos horrivelmente belo.
Ao fim de algumas horas começamos a descida com as mesmas precauções da

arriscada ascensão. A meio da tarde a serra guardava-nos uma surpresa:-uma

chuva intensa que caía das nuvens , que pairavam abaixo de nós. E foi

preciso esperar algum tempo para não descermos ao seu encontro.
Formosíssimo todo o Arquipélago especializei estas duas ilhas : o Faial,

que sintetiza a beleza; O Pico, que sintetiza a majestade. Ambas com as

outras 7 do Arquipélago constituem os melhores pergaminhos de nobresa do

nosso heroísmo antigo.
Reproduzo as palavras do erudito Bispo sr. D. António Meireles:

     « Vivemos no meio do nosso mar, e as suas ondas, revoltas e jubilosas,

cantam eternamente à volta das costas açoreanas o hino magnífico do nosso

domínio.»
Assim é de facto. O domínio de Portugal insular é grandioso e belo.

Recebemo-lo dos nossos maiores; cumpre-nos conservá-lo e engrandecê-lo pelo

nosso esforço para que os portugueses de hoje se tornem dignos dos seus

gloriosos antepassados."

Penso que esta narrativa tranmite de uma forma bem elucidativa toda a

beleza que se desfruta na subida à montanha, tal como agora, decorridos que

estão 100 anos . E posso garantir que as emoções que o autor sentiu tambem

não se alteraram. A não perder!  

Fica uma foto da montanha, num fim de tarde, para abrir o apetite! 


 

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publicado por viajantenocanal às 23:59
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Quinta-feira, 4 de Janeiro de 2007

Sobre o Pico

Cá estamos de novo. Depois das festas e de algum descanso, com algum abuso alimentar à mistura, toca a " gastar " algumas calorias.

Continuando com a narrativa da subida à montanha:

" Continuamos depois a caminhar.As nuvens pairavam já abaixo de nós e

tornavam-se mais compactas ao cair da tarde.O nosso horizonte estava agora

limitado pelas nuvens;não viamos a terra;caminhavamos fora do mundo.De vez

em quando, envolvia-nos um nevoeiro e era preciso parar para não nos

perdermos, para não irmos cair nalgum precipício, nalguma lagoa de águas

pouco profundas das muitas que iamos encontrando. Lembro-me que através do

nevoeiro, quando este pela sua tenuidade nos permitia ver ainda a certa

distância, os bois e os carneiros, que por ali pastavam, tomavam formas

gigantescas, como vistos através de lentes poderosas.
Aquela meia claridade do sol posto, é indescritível. A natureza rude do

monte agreste, banhado por ela, tomava uma doçura tal que parecia animada

dum mágico poder de traduzir um pensamento de resignação.Não havia o mais

ligeiro sopro de vento. As águas tranquilas dos pântanos acariciavam os

fetos verdes e mimosos; as próprias quebradas da montanha-algumas de

centenas metros de altura-não infundiam pavor; causavam um sentimento de

piedade, como em presença dum castigo da terra ingrata nas convulsões dum

sismo vingador.
Eu vivi umas horas de sonho. Envolto pelas nuvens, à luz melancólica do fim

do dia, havia no ambiente um quer que fôsse de feérico, de místico, de

sobrenatural.
Acordei desse sonho junto de uma imensa furna. Oa guias conduziram-nos ali

para repousarmos um pouco da noite. Era um verdadeiro salão de fadas essa

Furna. O tecto abobadado deixava pender estalactites de variadas formas.

Lateralmente, a rocha nua, irregular, esburacada, donde saía, a custo, uma

vegetação anémica. O solo regular, plano, alcatifado de folhas sêcas. A um

lado uma abertura quasi circular de cerca de 2 palmos de diametro, para a

qual os guias nos chamam a atenção, lançando nela uma pedra volumosa.

Ouvimos primeiro os sons ásperos da pedra batendo contra as paredes daquela

perfuração; depois sons de cada vez mais cavos, amortecidos pela distância

que a pedra ia percorrendo; depois....mais nada. Nunca ouvimos o baque

final da pedra caindo no fundo. Era uma perfuração interminável.
Nessa gruta nos hospedamos. Embora estivessemos em Julho, o termómetro do

Lacerda marcava 4 graus centígrados. Jantamos à luz dos archotes; mas os

guias aumentaram a iluminação lançando fogo às urzes sêcas, que revestiam a

encosta fronteita. Era um costume antigo daquela gente: incendiar a encosta

para tornar um pouco mais acessível os caminhos ínvios da serra deserta. Ao

ver arder tôda aquela encosta num aspecto bárbaro e pavoroso lembrei-me do

perverso desígnio do malfadado Nero mandando incendiar Roma.
Passamos pelo sono; mas pouco depois, noite fechada ainda, começamos a

subida íngreme do Pico Grande. O céu estava límpido, etéreo, sem um farrapo

de nuvens. As estrelas brilhavam mais e ao longe-muito ao longe-cintilava

frouxamente a iluminaçao dos faróis das costas açoreanas. Subimos, subimos,

subimos sempre. Aqui e além eram necessárias artes de acrobata, em saltos

perigosos, em suspensões arriscadas. Nenhum de nós falava. Só os guias

cantavam de vez em quando a melopeia das suas canções regionais. Lembro-me

duma cantiga, que tem um sabor popular regional aliado à sentimentalidade

própria da raça.
Dizia assim :

         « A neve do Pico Alto
         Ainda se não derreteu;
         E a palavra que me deste
         Ainda me não esqueceu!»

Começava já uma luz indecisa do crepúsculo matutino. As estrelas esmaeciam

na limpidez azulina dos céus. E era manhã quando chegamos ao alto do Pico

Grande. O frio era intensíssimo. O mercúrio do termómetro estava já abaixo

de zero. O Pico dava o mal; mas o Pico dava ....o remédio. Abaixo de nós

estava agora uma cratera larga, hiante, com pedregulhos ingentes de gelo:

mas era preciso subir mais ainda: ao cume do « Pico Pequeno ». 

 

Por hoje fico por aqui.No final tecerei algumas considerações. Obrigado pela paciência, mas recoradar ( e, para mim, também comparar, com a minha subida ) é viver.

Um Bom Ano

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publicado por viajantenocanal às 22:39
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